Texto: Luan Matheus Santana
No Piauí, em 2023, um total de 160 municípios do estado (71,4%) informaram que não dispunham de organismo executivo de políticas públicas direcionadas à defesa dos direitos das mulheres piauienses. Esse é o terceiro pior índice do nordeste, ficando atrás apenas da Bahia e Rio Grande do Norte. Para Madalena Nunes, da Frente Popular de Mulheres contra o Feminicídio, os dados demonstram que a ausência de políticas públicas para as mulheres nos municípios é um problema estrutural que contribui para a manutenção das desigualdades de gênero. “Ela aprofunda a violência contra as mulheres, por ausência do Estado, e afeta a vida, não apenas da mulher, mas da família e da sociedade como um todo”, afirma.
Os dados constam da Pesquisa de Informações Básicas Municipais – MUNIC 2023, realizada pelo IBGE. Merece ser destacado que, no Piauí, um quantitativo de 64 municípios (28,6%) dispunham de organismos executivos de políticas públicas voltadas à defesa dos direitos das mulheres, sendo que em 10 daqueles municípios havia uma Secretaria municipal exclusivamente voltada às mulheres.
Em 44 municípios que possuíam organismos executivos, o setor que trabalhava as políticas direcionadas às mulheres era subordinado a outra Secretária Municipal; já em outros 7 municípios, o setor que cuidava da política voltada às mulheres estava subordinado diretamente à Chefia do Executivo municipal. Por fim, outros 3 municípios que possuíam organismos executivos de defesa das mulheres apresentavam uma Secretaria Municipal em conjunto com outras políticas. Atualmente, as políticas públicas direcionadas às mulheres nos municípios, em sua grande maioria, estão associadas a organismos executivos que atuam na área de assistência social (91,5%), na área de saúde (21,2%) e em outras áreas (12,7%).
Em termos do sexo da pessoa dirigente dos órgãos executivos nas prefeituras, a grande maioria é do sexo feminino, com 81%, contra 19% do sexo masculino. Dos 64 municípios que possuem organismo executivo em defesa das mulheres, em 40 deles foi instituído um Conselho dos Direitos da Mulher, contudo só estavam ativos 23 desses conselhos. Dos que estavam em atividade, 20 deles tinham uma composição paritária entre Governo e sociedade civil, enquanto em 3 deles a maior representatividade era da sociedade civil.
Descompromisso com a prevenção e combate à violência contra as mulheres
De acordo com a Frente Popular de Mulheres contra o Feminicídio, a ausência de órgãos executivos de políticas públicas para as mulheres na maioria dos municípios é reflexo da falta de preocupação com a violência de gênero, a qual as mulheres são as maiores vítimas.
“Isso porque somos a maioria na sociedade e porque vivemos numa sociedade patriarcal. Isso demonstra que o Brasil, como um todo, não está preocupado com políticas públicas que possam reduzir a violência de gênero e até acabar com o Feminicídio. E por isso mesmo é o quinto país que mais mata mulheres no mundo, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que considera o Brasil um dos países mais violentos contra a mulher”, afirma Madalena Nunes.
A ativista explica ainda que o Feminicídio é resultado de um ciclo de violência que pode se encerrar com o assassinato da mulher. “Saber que a maioria dos municípios não promovem políticas de prevenção e combate a violência de gênero, para além da segurança pública, só nos resta a certeza de que o município, o Estado, o Brasil fomentam a violência contra a mulher”, denuncia.
Estrutura precária e insuficiente
Mesmo nas cidades onde existem órgãos gestores, os equipamentos públicos ainda são insuficientes. É o que denuncia Madalena Nunes e todo o coletivo de mulheres que compõe a Frente Popular de Mulheres contra o Feminicídio. “O que temos afinal? E quando quando temos… Delegacias precárias, que não são estruturadas para receber uma mulher em situação de violência. São insuficientes e ineficientes tanto do ponto de vista físico quanto técnico-organizacional; Temos uma Defensoria Pública com um corpo de atendimento escasso e defasado para a demanda; Isto tudo se soma a um Judiciário moroso e caro para os cofres públicos, onde os processos não andam, enquanto as mulheres morrem! Quando andam são em desfavor da mulher. Nas varas da infância, a tramitação é razoável quando se trata de alimentos. No entanto, há um descompasso com relação aos processos da Vara da Mulher, resultando que homens muito violentos obtenham a guarda das crianças, pois ele não passa de um inocente pai que alega alienação parental. Na realidade, a mulher ali é, muitas vezes, vista como louca ou algoz”, afirma.
A ausência de uma política pública executiva, organizada para garantir direitos e promoção de autonomia, igualdade e enfrentamento a todas as formas de violência contra as mulheres explica o enorme número de estupros, inclusive, de crianças e adolescentes; aumento de Feminicídios e tantos outros ataques aos direitos das mulheres, com destaque para o Piauí, que de acordo com a pesquisa, 71,4% dos municípios não dispõem de organismo executivo de políticas públicas direcionadas à defesa dos direitos das mulheres piauienses. Superando a média nacional que é de 68,7%.
“Importante registar que acabamos de sair do processo eleitoral, momento propício para cobrar mudanças. Em que pese as poucas prefeitas e vereadoras eleitas, também como consequência da ausência de políticas públicas executivas, é mais do que necessário que os movimentos sociais organizados, em especial, movimentos de mulheres feministas que lutam pela emancipação humana, cobrar de gestoras e gestores, a criação de órgãos executivos de proteção aos direitos das mulheres, de prevenção e combate às violências de gênero”, finaliza Madalena Nunes.
No Brasil
No Brasil, um total de 68,7% dos municípios também não dispunham de órgão executivo em apoio às mulheres. Entre os estados, as maiores proporções de municípios que também não possuíam aquele organismo executivo foram observadas: em Roraima (100%), em Santa Catarina (88,47%) e em Minas Gerais (85,11%). Por sua vez, as menores proporções foram as observadas em Pernambuco (1,08%), no Amapá (0%) e no Distrito Federal (0%).
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