Dona Maria chegou ao Palácio da Justiça, sede do Tribunal de Justiça do Piauí (TJ-PI), ao meio-dia em ponto. Sua audiência estava agendada para está quinta-feira (05/08), às 12:30h. Cinco minutos antes, às 12:25, dona Maria foi autorizada a entrar no prédio. Ela foi recebida pelo Presidente do TJ-PI, Desembargador José Ribamar Oliveira, uma hora depois, às 13:40h.
Diabética, dona Maria foi acolhida pelos funcionários do prédio que ofereceram uma banana e um copo d’água a ela enquanto aguardava para ser ouvida.“Eu podia até esperar esse tanto se eu tivesse na minha casa, agora nessa situação que eu tô não tenho mais esse tempo todo pra esperar não” diz dona Maria.
A peregrinação para contar sua história ao ocupante do mais importante cargo da justiça do Estado do Piauí, o Desembargador José Ribamar Oliveira, presidente do TJ, começou ainda no dia 22 de julho quando a comunidade e familiares de dona Maria realizaram um protesto na praça do judiciário piauiense clamando por justiça.
Do último pavimento do prédio, umas das funcionárias revela que escutaram todo o manifesto, fato que, segundo ela, sensibilizou o presidente a receber dona Maria. A primeira audiência então foi marcada para o dia 27 julho, porém neste dia dona Maria das Dores foi barrada na entrada pois estava vestida em um short, o que é proibido segundo as normas de conduta TJ-PI.
Encaminhamentos
Nesta quinta-feira, 05/08, ela foi recebida. Após a escuta da história de dona Maria, o presidente do TJ encaminhou que pediria prioridade em seu processo que corre na justiça, porém aguardando tramitação no fim de uma longa fila do sistema judiciário. Além disso, solicitar atendimento especial de Dona Maria na Defensoria Pública, que acompanha o caso desde 2009 e que mesmo assim não conseguiu evitar o despejo e a demolição da casa.
Werbert, filho mais velho da dona Maria, acompanhou a reunião. Ele avaliou o encontro de modo positivo e espera que a justiça seja feita. “Falamos nossa situação e o desembargador ficou surpreso com o caso, com tudo que foi feito para passar por cima dos direitos da minha mãe. Esperamos justiça, porque minha mãe foi atacada por vários órgãos, órgãos públicos que atacaram e negligenciaram seus direitos. É um absurdo. O que vai ser feito das pessoas pobres daqui pra frente?”, afirma.
Dona Maria denuncia casos de racismo sofridos
Quando forças do estado se erguem para retirar o direito de uma mulher negra e periférica, fica evidente como o racismo estrutural ainda é uma marca perversa da sociedade brasileira. Dona Maria pode não saber muito das leis, mas sabe muito bem como o racismo afeta sua vida.
“Por que o branco acha que a gente tem que morar no subúrbio, no mato, escondido, por que é negro (…) e nego tem que morar é na cidade, na rua que eu moro é uma rua mais ou menos, ai acho que o homem lá acha que eu não posso ficar nessa rua, por que eu sou uma negra, pobre, casinha ‘destiorada’, mas é minha, a casa é minha, da negra, negra.” diz dona Maria em reposta a outra Maria, Maria Lúcia, que acompanha o caso através do Centro de Defesa Ferreira de Sousa.
Relembre o caso:
Dona Maria das Dores. Dona Dôra ou apenas Dona Maria. Um nome comum, como o de muitas marias violentadas nesse país. Ela é o retrato da injustiça e do racismo estrutural da sociedade brasileira. Foi retirada de sua casa no dia 09 de julho, após emissão de um mandado de reintegração de posse pelo Juiz Jorge da Costa Veloso, do juizado especial cível – Zona Sudeste Anexo CEUT, em favor de Gerson Gomes Pereira.
O mandado foi emitido mesmo havendo outro processo ainda em tramitação, aguardando agora manifestação das partes citadas, dentro do prazo legal. Nem mesmo isso foi suficiente para impedir a força brutal do estado sobre as costas de Dona Maria, que em menos de uma semana, viu sua casa ser colocada baixo, demolindo não apenas os tijolos, mas toda a memória da sua vida, duramente erguida na Quadra 54 do Bairro Dirceu, zona sudeste de Teresina.
Contamos toda a história de Dona Maria aqui no Ocorre Diário, que você pode relembrar na matéria: “Me senti um lixo”, diz Dona Maria ao ser expulsa da casa onde morava há 30 anos
Por redação do corre diário
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