Um grupo de 25 pessoas, formado por indígenas dos povos Tabajara Tapuio, Guengê do Sangue, Kariri, Caboco Gamela e Warao da Venezuela, saíram no início do mês de Piauí em direção ao Distrito Federal, para integrar a 18ª Edição do Acampamento Terra Livre (ATL), considerada a maior mobilização indígena do Brasil. Neste ano, mais de 7 mil indígenas de 200 povos diferentes, marcharam pela demarcação dos territórios, defesa da vida e contra a agenda anti-indígena do governo brasileiro.
O Cacique Henrique Emanuel, representante do povo Tabajara na Aldeia Nazaré e atual Coordenador da microrregional da APOINME PI (Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo), liderou o grupo que esteve no Distrito Federal levando as demandas e reivindicações dos povos indígenas do Piauí.
“Nossa briga é que realmente haja garantia dos direitos que estão assegurados na Constituição. No acampamento participamos de muitas reuniões, com órgão institucionais e levamos a situação do nosso povo. Aqui não temos saúde indígena, não temos educação indígena, não temos terras demarcadas pelo Governo Federal. Essa luta é uma luta pela vida, pelas demarcações. Esperamos que um dia possamos ter acesso a nossos direitos”, afirma o cacique.
Além das questões locais, o grupo também se somou às lutas e mobilizações nacionais de enfrentamento à agenda anti-indígena do Governo e Congresso Nacional, onde tramitam projetos que violam os direitos dos povos originários, como o Projeto de Lei 191/2020, que dá abertura para a exploração das terras desses povos, e o PL 490/2007, que inviabiliza, na prática, a demarcação de terras indígenas. Durante a mobilização, lideranças se pronunciaram em cima de um carro de som e reforçaram a importância de desembarcar em Brasília, nesta semana, para lutar pela causa indígena.
Piauí é território indígena
Em 2021, mostramos aqui no Ocorre Diário os diferentes povos originários que habitavam este território antes da selva de pedra derrubar a vegetação nativa e dar lugar ao que chamamos hoje de Piauí. Dos Manguezais do litoral até a Caatinga, do Cerrado até a Mata dos Cocais, os Guajajaras, Gamelas, Tabajaras, Tapuios, Tremembés, Guengês, Kariris, Caboclos e Tacarijus já viviam por aqui, em uma relação harmoniosa com a natureza, construindo suas culturas a partir daquilo que a mãe terra (pachamama) oferecia.
A diversidade de povos e culturas, que vai do litoral ao extremo sul do estado, não foi suficiente para assegurar os direitos dos povos originários. Demorou mais de 500 anos desde a colonização para que o primeiro território indígena do Piauí fosse reconhecido e demarcado.
Ainda em 2016, o Instituto de Terras do Piauí (Interpi) iniciou o processo de arrecadação das terras públicas na região da Queimada Nova, onde fica localizado o território da comunidade indígena Kariri, a 560km de Teresina. No dia 19 de Abril do ano passado, a comunidade recebeu a titulação coletiva de 2.114,6769 hectares de terra, tornando-se a primeira do Estado a ter seu território demarcado.
O agronegócio, a mineração e os grandes “projetos de desenvolvimento” tem atacado constantemente as terras e a história indígena local. Mas a resistência sempre fez parte da vida dos povos indígenas, que hoje seguem reescrevendo sua história e reescrevendo também a história dos povos não-indígenas.
18ª Edição do Acampamento Terra Livre (ATL)
Considerada a maior mobilização indígena do Brasil, o acampamento ocorre no mesmo período em que o Congresso Nacional e o governo pautam a votação de projetos que violam os direitos dos povos indígenas. A mobilização é uma realização da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que volta a Brasília, neste ano, com o tema ‘Retomando o Brasil: Demarcar Territórios e Aldear a Política’. O ATL encerra no dia 14 de abril.
No texto de lançamento do Acampamento, a APIB chamou atenção para as pautas urgentes que ameaçam as vidas e tradições dos povos. “A demarcação dos nossos territórios segue como bandeira principal, de forma que a defesa pela vida contra a agenda de destruições é nossa prioridade”, afirma o documento.
O mês de abril é, historicamente, marcado pelas mobilizações indígenas por direitos. Nesse, que também é ano eleitoral, a denúncia às políticas anti-indígenas do Governo Federal ganharam centralidade. “Nosso Abril Indígena será marcado por ações simbólicas que mostrarão nossa capacidade na luta pela demarcação e aldeamento da política brasileira. Partimos da luta nos territórios virtuais e locais de atuação política e social, baseados na nossa sabedoria ancestral, no cuidado com o povo e com o território brasileiro para dizer: “a política será território indígena sim!”. Nosso intuito é promover o bem viver, reflorestamentos e aldear a política. Uma forma conjunta e democrática de decidir e conduzir futuros”, afirma o texto de lançamento do ATL 2022.
Mais informações você pode ver e ler, aqui.
Marco Temporal
Logo no primeiro dia do acampamento, Sônia Guajajara, coordenadora executiva da Apib, afirmou, durante a coletiva de imprensa, que os povos estão se preparando para voltar em junho para a capital, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) julgará o marco temporal. Esse julgamento irá definir o futuro das demarcações de terras indígenas no Brasil.
A Apib destaca que a tese do marco temporal restringe o direito das comunidades às terras que tradicionalmente ocupam e é repudiada pelos povos indígenas, que apontam a tese como inconstitucional. Em 2019, o STF reconheceu a repercussão geral do Recurso Extraordinário (RE) 1.017.365, caso que discute uma reintegração de posse movida contra o povo Xokleng, em Santa Catarina. Isso significa que a decisão tomada neste julgamento terá consequências para todos os povos indígenas do Brasil.
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