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Erro de distribuição e falta de diálogo atrasa vacinação de 1400 quilombolas no sudeste Piauí

No sudeste do Piauí, 118 comunidades formam o Território Quilombola Lagoas, que ocupa uma área de mais de 62 mil hectares de terra. Esse é o quarto maior quilombo, em extensão e em número de famílias, que se tem registro no Brasil. São cerca de 1.498 famílias quilombolas, que vivem entre os municípios de São Raimundo Nonato, Fartura do Piauí, Várzea Branca, São Lourenço do Piauí, Dirceu Arcoverde e Bonfim do Piauí.

Um território que guarda uma importância histórica incalculável, mas que ainda assim, segue sofrendo com a negligência do poder público, em seus diferentes níveis. Inseridos no grupo prioritário da vacinação contra a Covid-19, as primeiras  comunidades quilombolas do Território Lagoas iniciaram a vacinação no dia 31 de Março. 

Em documento enviado ao Ministério Público Federal e Defensoria Pública, a Associação Territorial do Quilombo Lagoas afirma que a vacinação não iniciou  inteiramente, uma vez que somente os territórios compreendidos nos núcleos do município de São Raimundo Nonato foram atendidos pela campanha. Os demais municípios só começaram a vacinar os quilombolas do Lagoas no começo desta semana e a perspectiva é que esse primeiro ciclo seja encerrado nesta sexta, 23 de abril. 

Em oficio enviado pela Defensoria Pública do Estado ao Governo do Estado, foi apresentado um quantitativo de 1400 pessoas que não receberam a vacina contra a Covid-19 no Quilombo. No documento foi identificado que essas doses deveriam ter sido encaminhadas aos seis municípios que compreendem o Território Quilombola Lagoas, entretanto, por um erro na distribuição (ainda não identificado), todas as vacinas foram encaminhadas para o município de São Raimundo Nonato, deixando assim quase metade da comunidade sem o imunizante.  

Claudio Teófilo -Líder Quilombola

Cláudio Teófilo Marques é uma das principais lideranças do quilombo e atual vice-presidente da Associação Territorial. Ele conta que esse problema trouxe muita incerteza e medo pra comunidade, além de um atraso de quase um mês na vacinação de algumas comunidades.

 

“Ainda não dá pra dizer que todos foram vacinados, porque não recebemos o resultado final, mas lhe garanto que ficaram muitas pessoas sem vacinar. Eu acredito que houve um erro, falta de cuidado e intenção por parte dos gestores. Houve o erro quando não chamaram a gente pra sentar e discutir como ia acontecer. Houve falta de cuidado foi quando não prestaram atenção quando falamos que as 3 mil doses eram para os seis Municípios. Houve intenção quando fizeram isso mesmo a gente explicando como deveria ser”, afirma. 

No ofício da Defensoria Público consta que a Secretaria da Saúde de São Raimundo Nonato recebeu 3962 doses, ao invés de receber 2562 relativas à população quilombola registrada nas UBSs dos núcleos em São Raimundo Nonato. Dessa forma, restou um total de 1400 doses cuja destinação é completamente desconhecida, não tendo sido objeto de qualquer comunicação pública e desrespeitando o Território Quilombola Lagoas, sua Associação Territorial e a função pública que a mesma secretaria assume.

Aproximadamente 13 mil quilombolas piauienses já haviam recebido, até o dia 12 de abril, a vacina que imuniza contra a Covid-19. O levantamento é do Projeto Vozes dos Quilombos, desenvolvido pela Defensoria Pública do Estado do Piauí (DPE-PI). Estima-se que no estado existam mais de 260 comunidades quilombolas, sendo que 83 já estão certificadas e outras 32 encontram-se com o processo de certificação em trâmite.

A comunidade quer saber: qual o motivo desse erro?

“Porque o nosso quilombo, que necessitava de apenas 3962 doses, teve esse problema todo. Até agora estamos sem entender”, questiona o líder quilombola Claudio Teofilo Marques. 

Procuramos a Secretaria de Estado da Saúde (SESAPI) e o Ministério da Saúde em busca de respostas. O superintendente regional do Ministério da Saúde no Piauí, Ferdinand Soares, informou que as informações que chegaram à SESAPI  a cerca dos núcleos que compreendem o Território Lagoas,  não fazia referência a três, que estavam localizados em outros municípios de Fartura do Piauí, Várzea Branca e São Lourenço. Assim, devido essa compreensão a vacina foi destinada ao município de São Raimundo Nonato. 

A nota informa ainda que foi realizado uma nova programação, onde os municípios não contemplados fizeram um levantamento do público e encaminharam para a Secretária de Estado da Saúde. As doses para estes municípios atenderem seus núcleos totalizaram 1.400. Ferdinand informou ainda que a Coordenação Estadual da vacinação solicitou à Secretaria Municipal de Saúde de São Raimundo Nonato a devolução das doses excedentes. 

Em entrevista à rádio local, o secretário municipal de saúde de São Raimundo Nonato confirmou o erro e que deve fazer a devolução das doses à Regional de Saúde. “As vacinas vieram nominal ao município de São Raimundo Nonato. No momento que chega. O coordenador não poderia entregar para outras cidades, mas sim para o São Raimundo . Recebemos esse quantitativo e iniciamos de forma rápida. Vacinar somente a população que reside nas comunidades”, afirmou. 

Território Quilombola Lagoas

O Quilombo Lagoas é um território de 62.365,8 hectares localizado entre 6 municípios do sudeste do Piauí, região identificada como Território do Desenvolvimento Sustentável Serra da Capivara. Ou seja, um terço dos municípios da região. Composto por 118 comunidades divididas em 12 núcleos, o quilombo Lagoas apresenta dimensões e uma dinâmica relativamente distintas com relação às demais comunidades quilombolas. 

O Quilombo Lagoas foi reconhecido em 2006 e tem seu processo de titulação finalizado em 2010 e devidamente julgado em 2014. A comunidade vive, assim, em uma janela de 14 anos sem qualquer condução de políticas públicas voltadas especificamente para as comunidades quilombolas do território Lagoas, em nenhum dos 6 municípios que o território abrange. Não seria exagero afirmar que, em todo esse tempo, políticas relativas à merenda escolar quilombola com verba federal, a aplicação da Lei 10.639/03, tal como as diversas dimensões da legislação ambiental, foram simplesmente ignoradas em diversas ocasiões. 

ATUALIZAÇÃO:

DEFENSORIA PÚBLICIA DO ESTADO DO PIAUÍ EMITE NOTA.

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