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Guerra química no Cerrado: agronegócio já envenenou o principal rio do Piauí

Definitivamente, estamos perdendo o Cerrado no Piauí. Pelo menos é o que diz a pesquisa publicada no Dossiê sobre Agrotóxicos nas Águas do Cerrado – “Vivendo em Territórios Contaminados”, realizado pelo Conselho Pastoral da Terra, em parceria com a Agência 10Envolvimento, Campanha Nacional em Defesa do Cerrado e pesquisadores da Fiocruz. O trabalho foi realizado nos Estados do Piauí, Maranhão, Tocantins e Mato Grosso do Sul.

Em todas as comunidades do Cerrado em que houve coleta de água para a pesquisa, foi identificado ao menos um resíduo de agrotóxico. Nos territórios participantes da pesquisa-ação – a Comunidade Barra da Lagoa (PI), o Acampamento Leonir Orback (GO), a Comunidade Geraizeira de Formosa do Rio Preto (BA), o Território Tradicional Serra do Centro (TO), o Território Cocalinho (MA), a Comunidade Cumbaru (MT) e o Assentamento Eldorado II (MS) – foram identificados, no total, 13 tipos diferentes substâncias químicas.

A conclusão do trabalho mostra que o Rio Parnaíba e os rios Paraguai, Cuibá, São Lourenço, Taquari, Paraná, São Francisco, Jequitinhonha, Itapecuru, Tocantins, Araguaia, Tapajós, Xingu, Madeira e todos seus afluentes que compõem o complexo hídrico do Cerrado, estão contaminados com agrotóxicos oriundos das lavouras do agronegócio. 

Coleta de água realizada para o dossiê no Mato Grosso do Sul. Foto: Bruno Santiago

Na Comunidade Barra da Lagoa, em Santa Filomena – PI, município distante 773 km de Teresina (capital), foram oitos (08) substâncias químicas diferentes encontradas nas águas. Santa Filomena se destaca pela produção de grãos. Só em 2021 foram produzidas 224.394 toneladas de soja. São mega empreendimentos de afetam diretamente os modos de vidas de inúmeras comunidades, como a Barra da Lagoa, onde moram 12 famílias,  aproximadamente 40 pessoas, que encontram nos rios, nos brejos e na agricultura de base familiar os meios para a produção e a reprodução da vida.

Segundo relato dos pesquisadores, a comunidade tinha tudo que precisava, cultivavam frutas, criava animais e “constituíam tessituras com a biodiversidade local, comida de verdade e soberania alimentar e nutricional”, diz o documento, acrescentando ainda que a insegurança jurídica da terra pela comunidade e o avanço do agronegócio tem “imputado rupturas nos modos de vida na Barra da Lagoa”. Os territórios dos ribeirinhos e dos brejeiros têm sido invadidos e devastados, dando lugar aos monocultivos, sobretudo, de soja.

De acordo com o relatório, em Barra da Lagoa e nas outras comunidades analisadas, são usados diariamente centenas de produtos venenosos, como herbicidas (entre eles, o glifosato, produto banido da Europa) e dessecantes (como o 2,4D – Ácido diclorofenoxiacético). Além desses, outros tipos de agrotóxicos estão em todos os rios e impactam os territórios das populações ribeirinhas, que tem provocado a contaminação de águas fundamentais para a reprodução social e ecológica da comunidade, como brejos e o principal rio da região, o Riozinho. 

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Cercados pelo agronegócio, a circulação de pessoas armadas restringem cotidianamente o acesso da comunidade aos bens comuns, enquanto, na água, os agrotóxicos vão contaminando corpos e territórios. Entre os venenos encontrados na água usada pela comunidade estão Atrazina, 2,4-D, azoxistrobina, difenoconazal, etofenprox, glifosato, Ciproconazol, Epoxiconazol, Fipronil, Metolacloro, Picoxistrobina. E pior, todos os agrotóxicos encontrados não são autorizados na União Europeia.

A soja concentra o uso de 60% dos agrotóxicos

Os resultados do Dossiê apresentam o crescimento avassalador dos monocultivos de soja sobre o Cerrado e quem ali habita. Mais de 50% da área plantada de soja está no Cerrado, cultivo que também utiliza a maior quantidade de agrotóxicos. Aproximadamente 60% de todos os produtos químicos utilizados no país são destinados à soja, o que não deixa dúvida sobre a gravidade da contaminação nesse território e sobre como isso poderá se intensificar caso as medidas necessárias não sejam tomadas.

A partir de pesquisas em bibliografias especializadas, identificou-se que mais de 43% dos ingredientes ativos (IAs) liberados no Brasil possuem uso autorizado na soja e que todos os dez agentes mais comercializados no país podem ser utilizados nesse cultivo. Tais números já seriam evidências da possível contaminação enfrentada pelas comunidades do Cerrado. Isso se confirmou quando, nas sete comunidades participantes da pesquisa-ação em que houve coleta de água, foram identificados, ao todo, 13 agrotóxicos diferentes.

Câncer, desregulação endócrina e a contaminação do ambiente

Os agrotoxicos encontrados nas águas dos principais rios do Cerrado brasileiro, para além da acontaminação ao meio ambiente, podem ainda causar inúmeras doenças. O Dossiê destaca os riscos de provocar cancêr e desregulação endócrina. 

Doenças muitas vezes sem cura, portanto, de carater inrrevesível. No caso da  desregulação endócrina, ela pode acarretar desordens na produção de hormônios, por exemplo, pode ter repercussões ao longo de toda a vida de uma pessoa se as exposições acontecerem em períodos críticos para seu desenvolvimento, como o período gestacional e a infância.

Outro ponto importante sobre esses dois efeitos provocados pelos agrotóxicos, os cânceres e a desregulação endócrina, é que eles não estão, necessariamente, relacionados à dose. Isso significa que qualquer nível de exposição diferente de zero é suficiente para causar dano à saúde.

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