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Mães na luta pela moradia: a história da ocupação Vila Verde em Teresina

No coração da zona leste surge mais um empreendimento imobiliário que irá abrigar aproximadamente 200 famílias em Teresina. Em uma das regiões mais valorizadas da cidade – próximo de terminal de ônibus, escolas, hospitais, supermercados e toda uma infraestrutura consolidada de serviços – o que esperamos naturalmente é pelo surgimento de mais um condomínio de alto padrão, no entanto, estamos falando de um dos grandes empreendimentos da luta popular pelo Direito à Moradia: a ocupação Vila Verde.

A ocupação que nasceu no dia 4 de janeiro de 2021, já é um dos símbolos e inspiração da auto-organização comunitária pelo acesso à casa digna em Teresina. Isso porque, o braço forte dessa luta são as mães, que representam a frente dessa luta.

São mulheres como a Nádia, Alaiane, Laisla, Fátima e Daniele, que tomam os rumos da luta pela moradia e que não escondem sua maior fonte de garra e esperança: seus filhos e filhas. 

“Sou eu que tô construindo sozinha, já levantei as paredes (…) eu e meus dois filhos”

Daniele

“eu morava junto com família, meu pai, minha mãe e outras pessoas (…) a gente foi procurar outro meio pra gente ter nosso cantinho, e aqui a gente tá se sentindo muito feliz.”

Fátima

“E assim a gente vai tentando ter uma moradia, ter um teto pra um dia a gente criar a filha, criar bem, com educação, com dignidade, por que todo mundo merece ter dignidade, ter um teto.”

Laisla

“Não estamos aqui pra tomar nada de ninguém, estamos aqui pra lutar pelos nossos direitos, por que na Constituição brasileira diz que todo trabalhador, todo brasileiro, tem direito à moradia digna, e esse terreno tava aqui desocupado há muito tempo.”

Alaiane

Cientes dos seus direitos, as mães da ocupação Vila Verde não puderam esperar pelo Estado, muito menos que a iniciativa privada lhes ofertasse uma moradia. E para elas uma casa não basta. A maioria decidiu enfrentar a luta pela posse do terreno também pelo que o bairro oferece; para as mães o principal serviço público é a escola que fica há poucos metros dali, a CMEI Mahatma Gandhi.

E como disse o próprio Gandhi “A terra provê o suficiente para as necessidades de cada um, mas não para a ganância dos homens.

Do Parque Universitário à Vila Verde: uma ocupação dentro de uma ocupação em 20 anos de impasse no acesso à moradia.

A Vila Verde está implantada em um lote público que hoje pertence à Prefeitura Municipal de Teresina. Há 20 anos atrás esse mesmo lote fazia parte de uma área maior, pertencente à União e de posse da Universidade Federal do Piauí. São 2 décadas que exemplificam alguns dos impasses do acesso à moradia digna, onde o Estado nem sempre é um aliado. 

Imagem: destaque para a área da União onde se originou a ocupação do Parque Universitário, em 2002, e área onde está a ocupação Vila Verde. Imagens: Google Earth

Em 2002, quando esse vazio urbano de 70 hectares às margens da av. Presidente Kennedy foi ocupado por aproximadamente 2 mil famílias sem teto, dando origem ao Parque Universitário, deu-se início a uma longa disputa judicial na qual as famílias resistiram à ordens de despejo até o ano de 2010, quando a UFPI abriu mão do papel do papel de algoz da comunidade.

No dia 4 de janeiro de 2021 – em meio à crise sanitária da covid-19 e quando atingimos um déficit habitacional de 98 mil moradia e 321 ocupações no município de Teresina, segundo dados da SEMDHU – cerca de 200 famílias ocuparam um lote que permanecia vazio no Parque Universitário.

O terreno está em posse da Prefeitura de Teresina e, segundo os moradores da região, estava abandonado há mais de 10 anos; no local, as promessas eram de implantação de uma horta comunitária, quadras de esporte e onde se construiria um prédio da igreja católica. Mas a realidade presente até bem pouco tempo atrás era de abandono, uma área dominada por matagal, fato que originou o “verde” que nomeia a ocupação.

Pois bem, a história se repete e se repetirá enquanto a ganância do acúmulo de terras for a ordem e o progresso estiver à venda.

Nossa esperança é como o amor materno, arma poderosíssima contra o capitalismo imobiliário, e que nos ensina que a luta comunitária pelo Direito à Moradia é como aquele dito popular que diz que em “coração de mãe sempre cabe mais um”, vencendo a lógica da individualização pelo coletivo, do acolhimento como método de resistência e provando que um lugar especial para viver não deveria ser negociado como um produto no mercado disponível para quem pagar mais, mas sim conquistado por direito.

Texto e imagens: Luan Rusvell / Arquiteto Urbanista Popular

Colaboração especial do Centro de Defesa Ferreira de Sousa e da OPA – Organização Popular.

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