Nos últimos seis anos, o estado do Piauí registrou um salto significativo de empregadores inseridos na ‘Lista Suja’ do trabalho escravo, passando de seis casos em 2018 para 37 em 2024, um aumento superior a 600%. Os números foram divulgados na semana passada e são atualizados pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) a cada seis meses. Um crescimento que envergonha o Estado, ao mesmo tempo que revela a manutenção de um sistema racista e colonial, que nega a humanidade de muitos para sustentar os privilégios de poucos.
De acordo com o levantamento, juntos, os registros envolvem 285 trabalhadores resgatados em situação degradante de trabalho. Em todo o Brasil são 654 registros. De acordo com a professora da Universidade Federal do Piauí e doutora em políticas públicas, Fabiana Almeida, o trabalho análogo à escravidão contemporâneo é a submissão do homem a condições degradantes e precárias de trabalho que envolvem a violação dos direitos e garantias individuais, de saúde, da liberdade de ir e vir e, na maioria das vezes, colocando em risco a sua vida.
“Envolve, ainda, o cumprimento de jornada exaustiva de trabalho em atividades que exigem muito esforço físico, insalubre e, muitas vezes, perigosa, além de manter o trabalhador afastado do convívio da sociedade, em locais de difícil acesso e sem comunicação, onde passa a conviver com violência física e psicológica e, que, por não recebem um salário justo, tornam-se refém de dívidas que são contraídas com o patrão para comprar alimentos e equipamentos de trabalho”, afirma.
A professora Fabiana Almeida ressalta ainda que esse cenário, em ascensão no Piauí e no Brasil como um todo, se sustenta pela falta de políticas públicas nas áreas social e econômica que promovam a inclusão. “O Brasil não é um único país; basta olharmos para as regiões norte, nordeste e sul, sudeste. É preciso tratar de forma desigual os desiguais para que possamos avançar em termos de igualdade social e econômica. E, exatamente, por serem as regiões norte e nordeste as mais carentes do nosso país, são nelas que encontramos os maiores índices de trabalho análogo à escravidão, assim como, de fornecedores de mão de obra escrava para outras regiões do país”, afirma.
Para além disso, ela destaca ainda a necessidade de campanhas de divulgação e conscientização acerca das diversas formas de escravidão humana; de investimento por parte do governo federal nas ações de fiscalização; legislação mais severa para os infratores. “Na minha opinião, a superação desse cenário se daria com educação de qualidade, inclusive com mais formação técnica, e a adoção de uma política econômica que proporcionasse mais oportunidades de trabalho à população”, completa.
Apesar de insuficiente, diante da complexidade desse cenário, a ‘lista suja’ do trabalho tem sido um instrumento de publicização dos violadores de direitos humanos e, de acordo com o procurador do Trabalho Edno Moura – coordenador de Combate ao Trabalho Escravo do MPT-PI, uma política pública importante para se somar ao trabalho repressivo que já é feito pelos órgãos como MTE, MPT, Polícia Rodoviária Federal e Polícia Federal.
“A lista é mais um instrumento punitivo para os empregadores que são flagrados submetendo trabalhadores a situação de trabalho escravo. Eles ficam impedidos de obter financiamentos nas instituições financeiras oficiais, por exemplo, dentre outras coisas. Mas é também um importante mecanismo para que a população possa acompanhar quem são os empregadores e evitar acordos e propostas de empregos”, pontua.
NE: Piauí só perde para Bahia em lista suja
Somados, os nove estados nordestinos tem um lista com 163 empregadores que mantinham homens e mulheres em trabalhos análogos à escravidão. Desse total, 22,7% estão no Piauí e 36,2% na Bahia. Juntos, os dois estados têm mais da metade dos registros na região.
Para a professora Fabiana Almeida, esses números têm relação direta com o contexto econômico desses estados. “O Piauí é um dos estados que segue à frente quando se fala em trabalho análogo à escravidão e isso acontece, exatamente, porque aqui, um dos estados mais pobres do Brasil, as oportunidades de trabalho são poucas, e é grande o número de pessoas analfabetas ou com um mínimo de instrução. O estado tem a maior taxa de analfabetismo do Brasil, segundo o IBGE, 14,8%. É preciso melhorar a educação, possibilitando o acesso a todas as pessoas e, com isso, construir uma política pública de acesso ao mercado de trabalho”, afirma.
E é importante destacar que a lista ainda não reflete o número real, já que até o empregador ser listado ocorrem diversas etapas. Ainda há muito o que se fazer, porque não adianta só combater, é preciso acabar com o mal pela raiz.
No Brasil, Ministério do Trabalho tem recorde de incluídos na ‘lista suja’ do Trabalho Escravo
Nesta edição, um total de 248 empregadores foram adicionados ao cadastro, representando o maior número de inclusões já registrado na história. Dentre esses, 43 foram inseridos devido à constatação de práticas de trabalho análogo à escravidão no âmbito doméstico.
As atividades econômicas com maior número de empregadores que foram adicionados na atualização corrente são: trabalho doméstico (43), cultivo de café (27), criação bovinos (22), produção de carvão (16) e construção civil (12).
A atualização ocorre semestralmente e tem a finalidade de dar transparência aos atos administrativos que decorrem das ações fiscais de combate ao trabalho análogo à escravidão. Essas ações são executadas por auditores–fiscais do trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que podem contar com a participação de integrantes da Defensoria Pública da União (DPU), Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Trabalho (MPT), da Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF), entre outras forças policiais.
Em 2024 já foram encontrados 142 pessoas em trabalho análogo à escravidão
O Ministério do Trabalho registra todos os empregadores, sejam eles pessoa jurídica ou física. Além disso, é importante destacar que somente entra na lista aqueles casos em que já houve processo administrativo julgado e concluído. Portanto, não havendo possibilidade de recursos.
No Piauí os registros foram realizados em 26 municípios: Patos do Piauí, Colônia do Gurguéia, Palmeira do Piauí, Canto do Buriti, Parnaíba, Monsenhor Gil, Piracuruca, Alvorada do Gurguéia, Buriti dos Lopes, Currais, Santa Cruz do Piauí, Flores do Piauí, Amarante, Antônio Almeida, São João da Serra, Jatobá do Piauí, Altos, Batalha, Campo Maior, Isaías Coelho, Itaueira, Marcolândia, Cristino Castro, São José do Peixe, Castelo do Piauí e Barras.
Foram 142 trabalhadores encontrados em regime análogo a escravidão no Piauí somente este ano. As equipes encontraram trabalhadores em alojamentos precários, muitos deles sendo barracões no meio do mato. Também se registra alimentação precária, falta de equipamentos de segurança, trabalhadores sem carteira assinada, sem direitos trabalhistas garantidos.
É importante destacar que o MPT-PI mantém canais abertos para receber denúncias. Elas podem ser anônimas através do Disque 100, do whatsApp do MPT-PI no (86) 99544 7488, pelo site www.prt22.mpt.mp.br ou ainda no site do Ministério do Trabalho e Emprego no www.ipe.sit.trabalho.gov.br.
Quem são e onde estão as empresas que praticam trabalho escravo no Piauí
EMPRESA: CERÂMICA J.A, RODOVIA PI, SENTIDO DE BARRAS A CABACEIRAS, KM 7, Nº S/N, ZONA RURAL, BARRAS/PI. EMPREGADOR: A. DE C. BORGES. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 09
EMPRESA: PEDREIRA VEREDA, RODOVIA PI-248, S/N, ZONA RURAL, FLORES DO PIAUÍ/PI. EMPREGADOR: ALMIR DA SILVA TORRES. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 07
EMPRESA: ANCAL CONSTRUCOES EIRELI – VEREDA, S/Nº, ZONA RURAL, FLORES DO PIAUÍ/PI. EMPREGADOR: ANCAL CONSTRUCOES EIRELI. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 04
EMPRESA: PEDREIRA D. MERCÊS, ZONA RURAL, CANTO DO BURITI/PI. EMPREGADOR: ANTÔNIO FRANCISCO MEDEIROS MARCIANO. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 07
EMPRESA: PEDREIRA DA PRATA, ZONA RURAL, JERUMENHA/PI. EMPREGADOR: CBS CONSTRUTORA LTDA. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 10
EMPRESA: INGAZEIRA, S/Nº, ZONA RURAL, CASTELO DO PIAUÍ/PI. EMPREGADOR: CONSTRUTORA D PAULO LTDA. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 11
EMPRESA: PEDREIRA INGAZEIRA, INGAZEIRA, S/Nº, ZONA RURAL, CASTELO DO PIAUÍ/PI. EMPREGADOR: CONSTRUTORA D PAULO LTDA. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 11
EMPRESA: CARNAUBAL NO POVOADO SANTA ROSA, ZONA RURAL, SÃO JOÃO DA SERRA/PI. EMPREGADOR: EDMILSON DA SILVA MONTE. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS:12
EMPRESA: FAZENDA ROSALINA, ZONA RURAL, CRISTINO CASTRO/PI. EMPREGADOR: EDUARDO MARTINS ROSAL. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 3
EMPRESA: CASA DE FARINHA SÃO CRISTÓVAO, MARCOLÂNDIA/PI. EMPREGADOR: ERINALDO EVANGELISTA DE SOUZA. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 3
EMPRESA: FAZENDA CASTELO, ZONA RURAL, ITAUEIRA/PI. EMPREGADOR: F DE S SANTIAGO. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 04
EMPRESA: SACO DO FUNDO, ZONA RURAL, ISAÍAS COELHO/PI. EMPREGADOR: FABIANO FRANCISCO DA SILVA. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 10
EMPRESA: FAZENDA CIPOAL, PEDRA MIÚDA, S/Nº, NA ZONA RURAL, BATALHA/PI. EMPREGADOR: FRANCISCO JOSE ALBUQUERQUE DE CARVALHO. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 4
EMPRESA: CARNAUBAL LOCALIZADO NA FAZENDA CRIOLI, ZONA RURAL, CAMPO MAIOR/PI. EMPREGADOR: FRANCISCO MARCELO SOARES. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 3
EMPRESA: RODOVIA PI-221, ASSENTAMENTO TESOURA, ZONA RURAL, ALTOS/PI. EMPREGADOR: GENIVALDO FERREIRA DE MELO. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 5
EMPRESA: FAZENDA CASCALHO, ZONA RURAL DE JATOBÁ DO PIAUÍ/PI. EMPREGADOR: GENTIL SOARES SILVA FILHO. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 8
EMPRESA: CARNAUBAL NO POVOADO LADEIRA, ZONA RURAL, SÃO JOÃO DA SERRA/PI. EMPREGADOR: GERSINO BARBOSA DE SEPULVIDA. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS:10
EMPRESA: ZONA RURAL, CURRAIS-PI. EMPREGADOR: GILVAN FARAH JUNIOR (539.969.761-00). NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 16
EMPRESA: PEDREIRA MORRO DE AREIA, SÍTIO MORRO DE AREIA, NA ZONA RURAL, CANTO DO BURITI/PI. EMPREGADOR: JOSÉ CARLOS DE SOUSA COSTA. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 06
EMPRESA: PEDREIRA NA BR 343, KM 535, ZONA RURAL, AMARANTE-PI. EMPREGADOR: JOSÉ DA CRUZ PAULINO DE SOUSA. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 13
EMPRESA: PEDREIRA CAFUNDÓ, ZONA RURAL, JERUMENHA/PI. EMPREGADOR: JOSE DA GUIA DE OLIVEIRA. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS:2
EMPRESA: PEDREIRA CATUABA, ZONA RURAL, FLORES DO PIAUÍ/PI. EMPREGADOR: JOSÉ EDSON DOS SANTOS FERREIRA. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS:3
EMPRESA: PEDREIRA, NO POVOADO TABULEIRO, ZONA RURAL, SANTA CRUZ DO PIAUÍ/PI. EMPREGADOR: JOSÉ PIO LOPES. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 12
EMPRESA: RESIDÊNCIA DE LENNISE LEITE LIMA. EMPREGADOR: LENNISE LEITE LIMA. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 1
EMPRESA: CARNAUBAL LOCALIZADO NA ZONA RURAL DE BURITI DOS LOPES/PI. EMPREGADOR: LEONIDAS DE BRITO FONTENELE. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 7
EMPRESA: ZONA RURAL, ALVORADA DO GURGUÉIA/PI. EMPREGADOR: MANOEL DE ARAUJO LOPES. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 15
EMPRESA: REA DE EXTRAÇÃO DE CARNAÚBA, ZONA RURAL, ALVORADA DO GURGUÉIA/PI. EMPREGADOR: MANOEL DE ARAÚJO LOPES. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 15
EMPRESA: POVOADO DE TABOLEIRO DOS GOMES, ZONA RURAL, PIRACURUCA-PI. EMPREGADOR: MARCIEL DE BRITO GOMES. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 3
EMPRESA: PROPRIEDADE DE EXTRAÇÃO DE CARNAÚBA, LOCALIZADA NO POVOADO NOVA OLINDA, ZONA RURAL, PIRACURURA/PI. EMPREGADOR: NILO FELIX CARDOSO. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 19
EMPRESA: AV. ZEQUINHA FREIRE, 2000, URUGUAI, TERESINA/PI. EMPREGADOR: NOVO JOQUEI INDUSTRIA E COMERCIO DE PREMOLDADOS LTDA. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 8
EMPRESA: PEDREIRA PASSA PERTO, ZONA RURAL, MONSENHOR GIL/PI. EMPREGADOR: PEDRO PEREIRA DA SILVA. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 2
EMPRESA: OFICINA DE FABRICAÇÃO DE ARTEFATOS DE COURO, NA AVENIDA JOSÉ DE MORAES CORREIA, Nº 2650, SANTA LUZIA, PARNAÍBA/PI. EMPREGADOR: R N SANTOS. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 1
EMPRESA: ZONA RURAL, PALMEIRA DO PIAUÍ/MA. EMPREGADOR: RAIMUNDO NONATO PEREIRA DE BRITO. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 10
EMPRESA: BR-324, S/N, ZONA RURAL, CANTO DO BURITI/PI. EMPREGADOR: RAUL ALVES DA COSTA FILHO (*1). NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 8
EMPRESA: FAZENDA MUNDO NOVO, S/N, ZONA RURAL, COLÔNIA DO GURGUÉIA/PI. EMPREGADOR: REMILSON ANDRÉ QUADRI. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 6
EMPRESA: POVOADO SACO DA EMA, ZONA RURAL, PATOS DO PIAUÍ/PI. EMPREGADOR: VALDENOR BORGES DE ANDRADE. NÚMERO DE TRABALHADORES ENVOLVIDOS: 10
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