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“O povo quer viver: a periferia contra o racismo, a política de repressão e morte”

Frei Serafim. Foto: João Albert

“Ecoou um canto forte na senzala”. Um ponto ancestral foi inscrito junto a tantas outras falas diversificadas que brotavam da quebrada ao centro durante a 3ª Marcha da Periferia, numa das muitas tardes quentes de fim de novembro em Teresina. Pela Frei Serafim: palavras de ordem, palavras rimadas, palavras há muito entoadas, algumas entocadas, outras engasgadas, represadas ou encantadas. No cartaz ou no gogó, vozes de mais de 500 anos pediam passagem. É que a oralidade é um legado: pode ter banzo mas é a prova de quebranto.

Na minha trajetória de moradora de entorno de lagoa da zona norte, tudo caminhava pra que minha primeira Marcha fosse o resultado de encontros que levaram tempo pra acontecer. Um deles recente foi com uma originária do Povo Puri, habitantes da Serra da Mantiqueira em Minas Gerais. Foi a partir de uma fala dela, numa oficina de grafismo indígena, que resolvi escrever um cartaz durante a concentração da Marcha no Parque da Cidadania. Ela tinha dito que as raízes caminhavam, não ficavam paradas! É uma mentira que árvore não se move. Então escrevi “Nossas raízes caminham da Zona Norte”, conectada com o pensamento que é cultivado na luta da Av. Boa Esperança. Lá onde tem as raízes da verdadeira região originária da cidade em que vivemos.

O Piauí é uma zona de transição de matas! Senti que aquele momento também era de semelhante transição. Existe essa mata que é também por dentro da gente, onde podemos entrar e, se pedirmos licença e tomar a benção, vamos conversar com nossa ancestralidade. Durante a concentração da Marcha no Parque da Cidadania, eu olhava em volta e em cada pessoa, sementes de mundo plantando-se de acordo com os encontros férteis ou não. Dias antes, na visão xamânica conduzida pelo maracá, instrumento que guarda toda uma floresta, eu vi uma abelha!  A tsatê do povo Puri me disse “Você é a responsável pelo pólen, conexão e comunicação de flores, responsável por frutificar. Você avisa, sente primeiro a floresta”

Então, de cada encontro eu carrego um pólen de espécies variadas e caminhantes e esse texto, alheio a selva de pedra da “objetividade jornalística”, é pra polenizar você que me lê neste momento, no sabor doce de flores centenárias: suas raízes estão caminhando, marchando, e vão se espalhar por toda essa cidade até firmarem ponto na terra mais uma vez, assentadas no coração de quem mora de com força no lugar a que pertence.

 

Texto: Lud Nascy, Jornalista e do corre de muitas artes! 

Fotos: João Albert

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