Entre janeiro e julho de 2021, o Piauí registrou 407 assassinatos, uma média de quase duas mortes por dia. A maioria desses homicídios foram no interior do estado, que registrou 230 mortes nesse mesmo período, concentrando 56% do total. Os números são da Secretaria Estadual de Segurança, disponíveis em seu site na internet. Mas o que de fato esses números querem dizer? Ou, o que esses números não revelam? Quais conclusões podemos chegar a partir deles?
É com o objetivo de responder a essas e outras perguntas que pesquisadores piauienses e organizações da sociedade civil começaram a desenvolver no estado uma experiência que busca refletir e produzir dados cidadãos acerca da segurança pública: o observatório da segurança. A iniciativa já nasce vinculada à Rede de Observatórios da Segurança, presente nos estados da Bahia, Ceará, Maranhão, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo.
“Começamos em 2018, na época da intervenção federal no Rio de Janeiro. Nesse momento, nós ficamos nos perguntamos o que fazer? Vamos criar um observatório e acompanhar o dia a dia, com mecanismos que nós somos capazes de produzir e não ficar à mercê dos dados oficiais. Isso, para entender o que está acontecendo, os fenômenos da segurança à luz das pesquisas e investigações locais. É importante termo uma capacidade de diálogo com todas as organizações da rede e ao mesmo tempo jogar luz no Piauí e contar isso pro resto do Brasil”, afirma Silvia Ramos, coordenadora da Rede de Observatórios da Segurança.
No Piauí, o monitoramento será feito pelo o Nupec – Núcleo de Pesquisas sobre Crianças, Adolescentes e Jovens, da Universidade Federal do Piauí – UFPI, uma iniciativa que já tem uma trajetória de quase 30 anos na temática da segurança pública. “É uma grande alegria para o NUPEC tocar esse projeto, justo no momento onde completamos três décadas de história. Esse, certamente, é um grande desafio: discutir e produzir dados sobre segurança pública, do modo que se propõe aqui”, afirma a professora Lila Luz, coordenadora do NUPEC.
Existem dinâmicas novas e preocupantes em curso, com movimentações de facções, novos tipos de violência em bairros periféricos, execuções de adolescentes e jovens concentradas em algumas áreas. Nesse contexto, a professora Dalva Macedo, vice coordenadora do Observatório no Piauí, ressalta que a segurança pública no estado não tem sido uma prioridade nos últimos anos.
“Desde 2013 acompanho, por meio de pesquisas que me atravessam, esse cenário e percebemos que não avançamos, pelo contrário, estamos retrocedendo. Quando vemos o aumento de jovens morrendo e encarcerados. Quando a gente ver o encarceramento em massa de jovens negros e periféricos. Esse é o ponto de chegada de uma questão que não vem sendo abraçada pela gestão estadual como uma questão social”, afirma.
Secretário de Segurança reconhece fragilidades das estatísticas oficiais e se coloca à disposição do Observatório
O secretário de segurança do Piauí, Coronel Rubens Pereira, esteve presente no lançamento e reconheceu que nem sempre as estatísticas oficiais representam a realidade, principalmente, segundo ele, em razão das subnotificações.
“Fico feliz porque nós, como gestores de segurança pública, dependemos de pesquisas. Nós precisamos desse apoio. Temos em plena atividade o Conselho Estadual de Segurança Pública, para que nos oriente. o Conselho é quem delibera o que será implementado e nós precisamos dessa base científica para saber se aquela política é a mais acertada. Coloco a disposição, a secretaria de segurança do Piauí”, afirmou.
Rede de Observatórios da Segurança completa 2 anos
A Rede surgiu para suprir a ausência ou omissão do Estado em produzir e divulgar amplamente dados confiáveis e de qualidade para que políticas públicas sejam avaliadas. É projeto do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), com apoio da Fundação Ford, e foi a primeira iniciativa a monitorar operações policiais no Brasil.
Ações policiais, eventos com armas letais e violência contra mulher são os maiores registros da Rede de Observatórios da Segurança nos seus dois anos de existência nos cinco estados monitorados. É o que mostra o relatório A vida resiste: além dos dados da violência lançado neste mês de julho. A publicação traz detalhes dos eventos violentos monitorados. O monitoramento é equivalente ao período de junho de 2019 até maio de 2021.
A polícia da Bahia se mostra a mais letal do Nordeste com 461 mortes. O estado também lidera o número de chacinas (74) na região – Dentre os estados monitorados, fica atrás apenas do Rio de Janeiro com 92 . Pernambuco é o estado mais perigoso para ser jovem com 165 mortes de crianças e adolescentes. Já Ceará é o estado mais perigoso para LGBTQIA+ com a maior taxa de violência contra essa população. São 6 casos por milhão de habitantes, uma taxa três vezes maior que a de São Paulo.
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