Atividade reuniu cerca de 17 pessoas pessoas comunicadoras e jornalistas integrantes da articulação na capital baiana durante os dias 25 e 26 de abril
Por Dayse Porto
A cidade de Salvador, capital da Bahia, foi palco da segunda atividade do ciclo de formações presenciais promovido pela Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores em 2024, a primeira aconteceu em março, com pessoas comunicadoras e jornalistas da região Norte. A atividade teve como objetivo debater e compartilhar estratégias relacionadas à proteção física, empoderamento legal, sustentabilidade financeira e comunicação popular e comunitária e reuniu 17 pessoas da região Nordeste.
O encontro proporcionou um espaço de diálogo e aprendizado entre profissionais engajados em promover um ambiente mais seguro e inclusivo para o exercício do jornalismo e da comunicação popular em uma atmosfera de colaboração e troca de experiências. Ao longo de dois dias, os participantes tiveram a oportunidade de se aprofundar em temas essenciais para o fortalecimento da liberdade de expressão e da democracia e também extremamente relevantes para a prática profissional cotidiana.
Estiveram presentes representantes da Agência de Notícias das Favelas (ANF), Coletivo Cotonete, Rádio Comunitária e Abraço Paraíba, Estadão Verifica, Ocorre Diário, TV Roda de Conversa, Rádio Comunitária Mituaçu, Mangue Jornalismo, Comissão Pastoral da Terra (CPT), Coletivo Cacos, Abraço Brasil, Entre Becos, Portal SoteroPreta, Rádio Comunitária 105,9 FM de Arapiraca AL, Instituto Mídia Étnica e Portal Correio Nagô. Veja como foi:
Boas práticas para proteção física: estratégias de prevenção e redução de danos
Durante o primeiro bloco da formação no Nordeste, Gizele Martins, comunicadora comunitária da favela da Maré e responsável pelo acolhimento de casos da Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores, liderou uma discussão sobre as boas práticas para proteção física no exercício para pessoas comunicadoras e jornalistas. Gizele destacou o papel essencial da memória, denúncia e resistência no enfrentamento dos desafios enfrentados pelos comunicadores.
Um dos pontos centrais abordados foi o projeto Maré Vive, uma iniciativa que surgiu durante a ocupação da Maré em preparação para eventos esportivos globais, como a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos. Este projeto serviu como exemplo de como as comunidades se unem para resistir e preservar a liberdade de expressão em meio a pressões externas.
Gizele ressaltou que os ataques às pessoas comunicadoras e jornalistas podem assumir diversas formas, desde pressões judiciais até ameaças físicas e psicológicas, todas com o objetivo de silenciar vozes dissidentes e distorcer narrativas consideradas inconvenientes. As discussões sobre assédio jurídico e digital, nesse sentido, emergiram como preocupação significativa, não apenas para a preservação da integridade profissional dos jornalistas, mas também sua saúde mental.
Durante o bloco, foram compartilhadas estratégias individuais e coletivas para enfrentar esses desafios, incluindo a importância de priorizar a saúde psicológica dos comunicadores e manter uma rede de apoio forte. Estratégias práticas, como não assinar individualmente matérias sensíveis e realizar limpezas periódicas nas redes sociais, foram indicadas como formas eficazes de minimizar o risco de retaliação.
Além disso, Gizele destacou a importância das organizações que oferecem suporte aos comunicadores, fornecendo recursos e redes de apoio essenciais para continuar atuando em meio a pressões constantes. O bloco também proporcionou um espaço para os participantes compartilharem exemplos de pressões enfrentadas localmente e discutirem estratégias para lidar com essas situações, enfatizando a importância da documentação e da avaliação coletiva para identificar a gravidade das ameaças enfrentadas.
Assédio judicial e empoderamento legal: proteção na esfera jurídica
No segundo bloco da formação, focado em assédio judicial e empoderamento legal, André Matheus, representante da Flora, Matheus & Mangabeira Sociedade de Advogados, ofereceu insights valiosos sobre como proteger jornalistas e comunicadores em meio a ameaças jurídicas. Ele enfatizou a importância de construir uma cronologia detalhada das apurações jornalísticas, destacando a necessidade de documentar cada etapa do processo para garantir a integridade das informações e proteger os comunicadores de possíveis retaliações judiciais.
Durante o bloco, André também ressaltou a importância de dar voz às fontes e evitar adjetivos que possam comprometer a imparcialidade das reportagens, especialmente em contextos jurídicos. Em período de pré-campanhas, ele destacou a necessidade de seguir diretrizes eleitorais para garantir uma cobertura equilibrada e evitar problemas legais, como propaganda irregular e violações de direitos de resposta.
Outro ponto abordado foi a responsabilidade dos veículos de comunicação em relação à disseminação de informações falsas, com ênfase na importância de manter uma cadeia de apuração sólida para evitar judicializações. André compartilhou exemplos de casos de assédio judicial e estratégias para lidar com eles, incluindo a importância de buscar apoio da Rede de Proteção e manter contato para esclarecer dúvidas sobre apuração de pautas e publicação de matérias.
No contexto atual, o empoderamento legal emergiu como uma ferramenta crucial para enfrentar os desafios enfrentados pelos jornalistas. A discussão enfatizou a necessidade de fortalecer as capacidades legais dos jornalistas para garantir sua liberdade de expressão e proteger o jornalismo independente diante das ameaças jurídicas cada vez mais presentes.
Boas práticas em comunicação popular: fortalecendo redes e comunidades
No terceiro bloco de formação, os participantes foram divididos em grupos para debater práticas de comunicação popular em quatro eixos temáticos: 1) Política de cuidado; 2) Negócios, imprensa e parcerias; 3) Cobertura nas eleições; e 4) Gestão de redes e comunidades. Os 4 grupos passaram por todos os eixos temáticos e a facilitação do bloco foi de Dayse Porto, educadora e comunicadora popular, e Caê Vatiero, da ARTIGO19.
No primeiro eixo, foram debatidas ações como construção de protocolos colaborativos, busca por uma divisão equânime do trabalho para diminuir a sobrecarga, criação de estratégias considerando realidades locais, aumento da diversidade nas organizações e combate ao assédio. Foi ressaltada a importância de formalizar espaços de escuta e sensibilizar lideranças e gestão para evitar o adoecimento e violências enfrentadas por comunicadores(as).
O segundo eixo destacou ferramentas para gerir o relacionamento com a imprensa e fazer parcerias, incluindo ter uma linha editorial, planejamento, cronograma e plano de comunicação. Política de gênero, código de ética e fidelização da audiência também foram mencionados como ferramentas importantes
No terceiro eixo, foram elencados desafios e oportunidades que as organizações têm durante o período eleitoral. O poder político e econômico dificulta o trabalho, mas o período eleitoral oferece oportunidades para realizar checagem de notícias, combater a desinformação e discurso de ódio, traçar perfis políticos e compartilhar conteúdos nas comunidades.
Por fim, o quarto eixo debateu como os coletivos podem gerir o impacto de suas atuações. O uso de mídias digitais foi destacado para o mapeamento de impressões do público e de atores estratégicos no campo. Em alguns territórios, o material impresso é fundamental para que a comunidade tenha acesso ao conteúdo publicado. Manter diálogo constante e participação ativa em movimentos de base, conselhos e sindicatos foram estratégias apontadas para gestão das comunidades.
Captação de recursos e sustentabilidade das organizações: estratégias para viabilidade financeira
No último bloco, dedicado à captação de recursos e sustentabilidade das organizações, Gabriela Guido e Verena Guimarães, representantes da TEIA, compartilharam estratégias valiosas para garantir a viabilidade financeira das iniciativas jornalísticas. Elas destacaram a importância de compreender as diversas vertentes da captação, indo além do aspecto financeiro e incluindo recursos humanos, parcerias e apoios institucionais.
Um ponto-chave abordado foi a diversidade de fontes de financiamento disponíveis, incluindo leis de incentivo, vendas diretas, campanhas de arrecadação, empresas, emendas parlamentares e fundações. As facilitadoras enfatizaram a necessidade de realizar pesquisas detalhadas sobre possíveis financiadores e explorar diversas estratégias, como financiamento coletivo e parcerias com empresas, tanto nacionais quanto internacionais.
O autoconhecimento das organizações jornalísticas foi destacado como fundamental, incluindo o entendimento da audiência, a definição de uma linha editorial e a adoção de um código de ética. Além disso, ressaltaram a importância de abordar a sustentabilidade financeira de forma ampla, considerando não apenas a geração de recursos, mas também o pagamento justo pelo trabalho realizado.
Estratégias de planejamento para a captação de recursos foram abordadas detalhadamente, destacando a importância de avaliar o histórico da organização, identificar potencialidades e pontos de melhoria, além de definir metas claras e alcançáveis. A análise SWOT (Strengths, Weaknesses, Opportunities, Threats) foi mencionada como uma ferramenta essencial para identificar oportunidades e ameaças, e orientar as estratégias futuras.
Outro aspecto importante foi a construção de um capital social sólido, envolvendo a apresentação do projeto de forma convincente, o estabelecimento de metas claras e o desenvolvimento de parcerias estratégicas. A criação de fluxos internos com projetos prontos e adaptáveis a diferentes editais foi destacada como uma prática eficaz para otimizar o processo de captação de recursos.
Por fim, as facilitadoras enfatizaram a importância de incluir a acessibilidade cultural nos projetos, garantindo que as iniciativas jornalísticas sejam acessíveis a todos os públicos e promovam a diversidade e a inclusão em sua atuação.
Deixe um comentário