Diante das constantes ações repressivas em bairros pobres da cidade pesquisadores da UFPI repudiam ação do Projeto Vila Bairro Segurança. “Esta não é a política de habitação e nem a política de assistência social que nós queremos”, afirmam pesquisadores”. No entender dos moradores do Bairro São Joaquim, esta é mais uma política higienizadora que visa excluir os moradores do seu direito à cidade. Internautas questionam “porque não chegam nos bares na Zona Leste fazendo a mesma abordagem truculenta?”. Confira a seguir a nota do Nupec/UFPI contra criminalização das juventudes teresinenses.
O Núcleo de Pesquisa sobre Crianças, Adolescentes e Jovens (NUPEC/UFPI), vem a público, por meio de seus docentes, discentes e demais pesquisadores, manifestar repúdio aos atos violentos de abordagens, notificações e prisões realizadas na região da zona Norte da cidade de Teresina, Estado do Piauí, como parte da política de patrulhamento ostensivo perpetrada contra jovens, da periferia da cidade, pela Polícia Militar e Guarda Municipal, sob parceria com a Secretaria Municipal de Cidadania, Assistência Social e Políticas Integradas-SEMCASPI.
As ações de patrulhamento ostensivo vêm sendo realizadas quinzenalmente, desde o início deste ano, como parte do dissimulado projeto “Vila Bairro Segurança”. Trata-se de um projeto coordenado pela SEMCASPI que declara ter como objetivo manter a segurança em bairros de Teresina, com a realização de ações como a “Blitz do Sufoco” e “Teresina Protege”. Entretanto, em geral, os alvos das abordagens são jovens negros da periferia que, apenas a partir de suas aparências, são tomados como prováveis envolvidos com violência e criminalidade. Como suspeitos, são fartamente abordados e “baculejados”, sob a justificativa de prevenção de delito, ferindo frontalmente o Estado de Direito.
Ato contínuo, em absoluta consonância com os comportamentos sensacionalistas e de espetacularização da vida privada, a SEMCASPI tem viabilizado nas suas mídias sociais e local a circulação de imagens de jovens emparedados, com as mãos na cabeça, em situação de constrangimento, sendo a maioria de negros (vide fotos abaixo).
Identificamos nesses atos uma forma de criminalização da pobreza, fenômeno que desde a metade do século passado já havia sido denunciado como prática inaceitável no âmbito da assistência e do Serviço Social brasileiro. Definitivamente, tratar pobreza como caso de polícia não é uma ação legítima quando tratamos da real e legítima assistência que o Estado deve prestar ao cidadão! Assim, chama nossa atenção o envolvimento de profissionais da área nos citados projetos, por entendermos que assistentes sociais deveriam – ao contrário – estar trabalhando para garantir o direito dos jovens terem, pelo menos, sua imagem preservada.
Por esta razão, preocupa-nos por demais que uma Assistente Social e gestora da SEMCASPI, ao fazer referências às ações do dissimulado projeto, tenha destacado: “São números importantes, fruto de um trabalho integrado de vários órgãos. O Vila Bairro Segurança é um projeto que conta com o total apoio do nosso secretário Samuel Silveira e de toda a equipe da Semcaspi, assim como do prefeito Firmino Filho, do Governo do Estado e instituições como o Conselho Tutelar, Guarda Municipal, Polícias Militar e Civil, Detran e Tribunal de Justiça. Sem dúvidas, é um trabalho com resultados consideráveis”.
Atente-se para o fato de que dentre as ações do tal projeto não sejam destacadas aquelas realizadas por parceria com a Fundação Monsenhor Chaves, FMS, SEMEC ou SEMEST, mas apenas essas das esferas da ação repressora do município, deixando claro o entendimento da SEMCASPI sobre o que é ação de segurança, em se tratando de jovens empobrecidos.
Como de público conhecimento, presenciamos, na atual conjuntura, o desmonte das políticas públicas minimamente desenhadas a partir da CF de 1988. Por isso, causa-nos estranheza que em pleno cenário de esvaziamento das ações da Política de Assistência Social e da sempre anêmica Política de Juventude, os órgãos restantes que deveriam proteger nossos jovens, estejam envolvidos em uma ação de patrulhamento policial ostensivo, nitidamente desenhada como medida de limpeza social.
A questão torna-se ainda mais grave, pois o tratamento que os gestores da cidade têm destinado aos jovens, não exibe nenhum esforço para minimizar as altas taxas de homicídio e suicídio, para criar condições de estudos, trabalho e saúde para essa faixa etária. Em vez disso, não tendo o interesse e não sabendo o que fazer com a complexidade da realidade em que vivem os jovens adolescentes, dos gestores perdura a identificação, sobretudo dos pobres e negros, como produtores de violência, restando-lhes apenas ação repressiva e o “ajuste” de comportamento, com a finalidade de torná-los aptos ao trabalho precário e dóceis à vida indigna que levam.
No nosso modo de ver, a visão das juventudes como problema social remonta, renova e reafirma concepções antigas sobre a juventude pobre e negra como perigosa, refinando-se tal iniciativa com a espetacularização do fenômeno, como se faz em Teresina. Tal medida, além de buscar a legitimação social do conjunto de práticas repressoras no cotidiano da periferia da cidade, alcança o objetivo final de divulgação da plataforma político-eleitoral de alguns gestores. Duplamente reprovável, portanto.
Diante da gravidade da situação, o NUPEC∕UFPI se manifesta veementemente contra todas as formas de criminalização gratuita e cerceamento de direitos de todo e qualquer jovem, especialmente quando se trata de medidas maquiadas como de assistência social. Que a SEMCASPI, a Secretaria de Juventudes e demais gestores se ocupem em usar o dinheiro público para desenvolver políticas que promovam os talentos juvenis, gerando oportunidades reais e socialmente aceitáveis de desenvolvimento a que nossos jovens têm direito.
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