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Segurança Pública para a vida ou para morte? Comunidade do São Joaquim discute questão

“Nós não aceitamos a chibatada da polícia, nossos ancestrais já sofreram o bastante. Lutamos contra a política de opressão. Não queremos polícia armada, queremos escola, hospitais, creches e digo mais,queremos participar dos recursos do banco mundial e não aceitamos a política de cima pra baixo do Lagoas do Norte”, dizia Lúcia no encerramento da roda de discussão que debateu segurança pública no último domingo (05).  A voz estridente da mulher que luta por moradia e, agora tem acrescido à sua resistência as ações policiais, eram o suficiente para atravessar não somente os tímpanos, mas também dilacerar a alma.

Movimentos sociais de toda a cidade se reuniram no São Joaquim em adesão à população que pergunta “Vila Bairro Segurança pra quem?”. Segundo Bye bye, vulgo Gutemberg, se todo a comunidade está se reunindo é porque o problema é da coletividade e a avaliação da roda de conversa é que começar o Programa de Segurança na região do Programa Lagoas do Norte é um indicativo forte de que há interesses em higienizar a área “ Aqui se for descacterizado para ser um parque, vamos perder toda a nossa história e os laços comunitários. E o problema não é só daqui, o problema é da cidade toda, por isso que tem gente aqui da cidade todo”, diz o artista e morador da Av. Boa Esperança.

Para a pesquisadora do Nupec-UFPI (Núcleo de Pesquisa sobre a Criança, Adolescente e Jovens), Lila Xavier, “Isso que tá acontecendo no Bairro e na região, que se estende até a SMC, não é novo no cenário político brasileiro e piauiense. Em alguns lugares, como na Santa Maria da Codipi  isso já acontece há mais tempo. Funciona pela criação do medo de que a juventude é o perigo. Em alguns relatos, os jovens dizem que porque estão vestidos de algum modos, já são abordados porque podem ser bandidos”, explica afirmando que se trata de uma política de criminalização da pobreza e da juventude negra das periferias.

A pesquisadora afirma ainda que este projeto da prefeitura é um projeto de limpeza social que tira os jovens da praça, da escola, tira o jovem de circulação. “A ação clara e recorrente desse projeto é ir nos finais de semana nos bares, único lazes que tem na periferia”, diz Lila. Deste modo, a política dita de segurança corre no sentido contrário, pois não assegura, põe medo.

“Vivemos sob ótima de guerra, uma ótica do inimigo”, quem é o inimigo que vemos na TV?

Dados do Atlas da violência de 2018 sobre Teresina dão conta de confirmar os relatos. Segundo o estudo, Teresina com  com uma populaçõa de 847.430, tem uma taxa de homicídio de 46,8%, acima da média nacional que é de 38,67% . Além disso, a porcentagem de jovens entre 15 e 24 anos que não estudam, nem trabalho e são vulneráveis a pobreza é de  11,6%, acima da média nacional que apresenta 9,03% . Achou pouco? Então, saca só, a taxa de desocupação entre jovens de 18 a 24 anos é de 21,6% , enquanto a média nacional é de 15,80%.  E na habitação, tá ligado como é o barraco da população? A porcentagem de pessoas em domicílios com abastecimento de água e esgotamento sanitário inadequados é de 2,2%, e a média nacional é de 3,83%.

Em outras palavras, se isso fosse um rap ficaria assim: o menino não tinha escola, então não encontrou trampo. O menino foi pra rua, onde só tinha a polícia com seu canhão, o menino ficou perdido no meio dessa sequencia de exclusão. Sequencia de pressão. Ele pegou muita pressão…. Tá bom, não somos bons de rima e nem de rap (risos), mas deu pra sacar o que a Pesquisadora da UnB, nossa conterrânea Bruna  Stefania explica. Repara. A Bruna questiona “Queremos uma segurança pública para a vida ou para morte? A gente vive sob uma ótica de guerra, uma ótica do inimigo e quem é o inimigo que os programas policiais da TV falam? Estamos confundindo segurança com controle e extermínio. Segurança pública é ter pessoas armadas? Ou ter paradas de ônibus seguras e próximos, hospitais, creches, lugares de cultura e lazer?

Comunidade exige uso dos espaços públicos e fim de militarização

Zeus, Marcondes Brito, do NUPEC e Covil (Ceará), lembra que o nordeste durante dez anos foi considerado a região mais violenta do país e capitais como Recife conseguiram reverter isso com políticas sociais e culturais. Um dos programas adotados em Recife é o Compaz que tem o viés de fortalecimento comunitário. E na Therell, o que manda? Na capital do calor, a comunidade do São Joaquim fez um projeto solicitando uma sede para um espaço social e cultural, mas sabe o que eles receberam? Isso mesmo, um quartel. Mais polícia, porque aqui embaixo é só tiro, porrada e bomba.

Em nota, a prefeitura esclarece “A Secretaria Municipal de Cidadania, Assistência Social e Políticas Integradas (Semcaspi) destaca que a realização do Programa Vila Bairro Segurança está estruturada como uma ação municipal com o objetivo de promover uma política de não violência, além de aumentar a sensação de segurança. Assim, constitui uma resposta concreta da Prefeitura de Teresina, através de ações articuladas em três frentes: prevenção, proteção e pesquisa/monitoramento”. A Secretaria afirma ainda que estudos apontam a Zona Norte da capital como uma das mais violentas, no entanto, pesquisadores e comunidade se queixam de que os números são sazonais e além disso, diante do exposto, a população precisaria de políticas sociais para conter a violência.

Segundo a Semcaspi, se resolveu iniciar o Programa Vila Bairro Segurança nos 13 bairros que compõem o Parque Lagoas do Norte, sendo eles:Acarape, Aeroporto, Alto Alegre, Itaperu, Mafrense, Matadouro, Mocambinho, Nova Brasília, Olarias, Parque Alvorada, Poti Velho, São Francisco e São Joaquim. A expansão para outras zonas da cidade virá a partir da finalização e análise dos resultados sobre a atuação e impacto do programa na região do Lagoas do Norte.

A Secretaria aponta projetos como     Educando para prevenir, Sou capaz, Meu Bairro é vivo e Paz nas escolas, no entanto, eles são considerados pela comunidade como irrisórios e extremamente pontuais e focalizados, pois são fazem parte um projeto e um programa de sociedade que visa arrasar e romper as estruturas de desigualdade de opressão. Na opinião dos moradores, o Vila Bairro Segurança, vai na direção contrária, pois ataca frontalmente os únicos espaços de lazer da juventude nas periferias “fica muito clara a perseguição nas casas de reggae da região”, pontua Lúcia. E segundo a Semcaspi as ações devem acontecer, sobretudo, de quinta a sábado, sob a justificativa de ser o período de maior índice de violência ao redor dos bares, assim, defendendo que esta é sua estratégia contra a violência (?).

Outra ponto questionado pelo pesquisador Zeus é o fato da Guarda Municipal ser armada, ele questiona que nem todas as guardas municipais do Brasil são armadas, porque a Teresina seria? “Uma secretatia de asssitência social que deveria tá fazendo cursos, potencializando os vínculos comunitários, ações de renda… tem como principal ação de assistência uma guarda armada. O que a prefeitura chama de segurança pública é sim uma ação militarizada de criminalização da pobreza. E porque na Zona Norte? Tem algo muito importante aqui que a prefeitura quer expulsar os moradores”, diz reiterando que não se faz segurança pública sem equipamentos sociais.

A forma básica de enfrentar a violencia é a ocupação de espaços públicos culturais. Ah bom, então é fácil, basta estar presente nos espaços públicos e desenvolver ações, isso até a comunidade pode fazer, né? Aí os manos e as manas do hip hop decidiram ocupar a praça dos skatistas no Parque Lagoas Norte, lógico que eles foram bem recebidos, ném? Errado. A molecada se queixa de que todas as terças-feiras na hora de mandar as rimas nas batalhas, falta energia justamente naquele ponto. O caso, foi citado em uma reportagem do TV Club 2ª Edição do dia sobre iluminação pública.

Roda de debate finalizou com batalha de hip hop

A roda de discussão sobre segurança pública reuniu militantes de movimentos sociais de vários bairros da cidade, além de Mc’s da zona sul e da Santa Maria da Codipi. A conversa acabou com uma batalha de hip hop para extremecer e encher de gás. Quanta potência!

“Lagoa do norte pra população, não vão enricar com o que construímos com nossas mãos, lagoas do norte é da gente, a prefeitura quer tirar da gente. Sabe porque? Porque é zona valorizada, é só quinze minutos pro centro, tá ligado é isso. Porque eles eles querem espaço prum monte de prédio construir. É por isso que eu detono com ele nas rimas. Origem de Teresina, Lagoas do Norte, de onde veio os oleiros e a galera forte que construiu essa cidade. É isso aí, os indios que estavam aqui e agora é a gente que eles querem oprimir” cantou e encantou a Sabrina vencendora da Batalha de hip hop da noite.

Mas teve também o mano Mc DK, moleque de responsa, morador da Av. Boa esperança que questionou na sua rima “Moro tanto tempo nessa rua, tu acha mesmo que eu vou sair daqui por causa de obra da prefeitura?”, a cada rima a favor do empoderamento comunitário e contra a violência policial levava idosos, crianças e jovens a níveis de esperança explosivos. Que dirá a dona Paruca, que no final dançou e rimou com os manos e com as minas. Ela que já mora no local desde 1982 também não está gostando dessa história de guarda armada. Nêgo Doca e Preto Fúria também mandaram suas rimas na batalha.

Assina do texto: A Panfletária

Imagens: Matheus Asmassallan

 

 

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