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Sobre as cheias e uma pandemia

No final e no início dos anos nuvens carregadas se precipitam na bacia do rio parnaíba. Invariavelmente esse período é dedicado (pelo bem ou pelo mal), nas nossas agendas, a este evento nordestinamente bem aguardado.

As consequências costumam acontecer de uma maneira tão corriqueira que nem sequer nos damos conta da nossa clarividência anual: chove, aumenta o nível do Parnaíba, aumenta o nível do Poty, a água transborda e enche os terrenos ribeirinhos.

Se perguntarmos a qualquer morador da região a razão do transbordamento dos rios, a resposta virá de prontidão: Porque chove muito, ora mais! Com muita água o rio enche, com mais água ainda o rio transborda.

Pois bem! Agora mudando de assunto…

O desafio de pensar políticas de conter uma pandemia em locais que alagam. Olha pra cá, poder público.

Imagine uma doença para a qual não se tem cura nem vacina, que se espalha muito velozmente deixando uma grande quantidade de doentes e mortos. Essa doença atrapalha o trabalho do pulmão, deixando o indivíduo “sem fôlego” e, quando não, matando por ineficiência da respiração.

A maneira de tratar essa falha pulmonar é por meio de intubação. O sujeito é colocado em coma induzido, e uma máquina faz o trabalho que os seus pulmões deveriam estar fazendo.

Agora imagine várias pessoas adoecendo juntas. Seria necessário alguns respiradores para ajudar nos seus tratamentos. Entretanto, numa enxurrada de pessoas adoecendo (milhões) seria necessário tantos respiradores, tantos profissionais de saúde, tanto equipamento de saúde, que o sistema de saúde não daria conta e as pessoas seriam deixadas à deriva.

O sistema de saúde pode sim passar por uma cheia como os rios passam. Em vez de transbordar água, transbordaria doentes. Mas há uma diferença entre um e outro. Não conseguimos esticar o tempo de chuva para chover em menor intensidade enquanto os rios dão vazão a todo o volume. Mas podemos tentar evitar a doença para que todos os doentes não cheguem em enxurrada ao hospital, mas em garoas, dando tempo de atender a todas e todos.

Por isso, buscar se isolar neste momento é fundamental e é um direito de todos que precisa ser garantido pelo governo (Que deve nos dar as condições para tal). Mudar de hábitos de maneira tão repentina não é fácil, mas é necessário. Certamente nenhum de nós quer ser levado por essa enxurrada.

Texto: Kassio Costa, acadêmico de Medicina, fez parte do Grupo de Estudos em Saúde Pública da UFPI.

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