A crise sanitária aumentou a opressão às pessoas travestis e transexuais
Este conteúdo faz parte da série de reportagens sobre Direitos Humanos realizada pelos estudantes do curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) matriculados na disciplina Direitos Humanos, Comunicação e Políticas Públicas, unidade ministrada pelo professor Dr. Antonino Condoreli. As reportagens têm como objetivo refletir as questões de direitos humanos criando ambiente crítico no âmbito da mídia, além de contribuir para a disseminação dos conteúdos acadêmicos na sociedade.
Por Fernanda Tainara Macedo Lopes e Tiago Silva de Oliveira
Frida acaba de sair de uma reunião; atende à chamada pelo WhatsApp no quarto, sentada à cama. De Fernandópolis, São Paulo, as paredes roxas do quarto emolduram seu rosto na tela do celular. Formada em Letras e mestre em Educação Sexual, Frida é uma das poucas mulheres trans que teve acesso à universidade. “Somos expulsas de casa em média com 13 anos de idade, assim como da escola”, disse.
A maioria da população trans vive sob condições de miséria e marginalidade. Não têm acesso, por exemplo, à saúde, educação, emprego, moradia.
Levantamento da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) aponta que o Brasil ainda é o país que mais mata transexuais, com 40% dos casos. A expectativa de vida desse grupo é 35 anos, metade da média nacional. E a maioria das mortes apresenta requintes de crueldade. O assassinato de Quelly da Silva, 35, em Campinas (SP), que teve o coração arrancado, é um exemplo brutal de transfobia. “Ele era um demônio, eu arranquei o coração dele. É isso”, confessou Caio Santos de Oliveira.
Para a socióloga Berenice Bento, o transfeminicídio caracteriza-se “como uma política disseminada, intencional e sistemática de eliminação da população trans, motivada pelo ódio, abjeção e nojo”.
De acordo com o “Dossiê dos assassinatos e da violência contra travestis e transexuais brasileiras em 2019”, nesse ano, foram confirmados 124 assassinatos de pessoas trans, sendo 121 travestis e mulheres transexuais e 3 homens trans.
No ano de 2019, foram 124 assassinatos de pessoas trans, sendo 121 travestis e mulheres transexuais e 3 homens trans.
São Paulo foi o estado que mais matou pessoas trans, com 21 assassinatos, seguido do Ceará; com 11 casos; Bahia e Pernambuco, com 8; Paraná, Rio de janeiro e Rio Grande do Sul, com 7 casos cada; e Goiás com 6 casos. Amazonas, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso e Paraíba aparecem com 5 casos cada; Espírito Santo, Pará e Rio Grande do Norte com 4; Alagoas, Rondônia e Tocantins com 2; e 1 caso em Mato Grosso do Sul, Roraima, Sergipe e Piauí.
Frida conta que a situação das pessoas trans e travestis durante a pandemia de Covid-19 se agravou. “As pessoas trans não tiveram acesso à quarentena; apenas as pessoas cis”.
Devido à exclusão, muitas são empurradas para a prostituição. Elas têm de pagar diárias às cafetinas para não serem jogadas na rua, pedágio às travestis mais velhas para poderem trabalhar em um determinado ponto, e propina para policiais para não serem espancadas ou estorquidas.
O uso de silicone industrial também é comum. Muitas morrem devido à inflamação do produto do corpo. E, quando esse problema combina-se com o HIV e a Covid-19, é uma verdadeira sentença de morte.
Sarah Fagundes é estudante de Direito. Ela mora em Criciúma, Santa Catarina. A conversa de dá durante o intervalo da aula. “É muita correria; eu trabalho de dia para estudar à noite”, comenta.
Mulher trans negra, a futura advogada sente de perto a opressão desta sociedade. “Eu corto logo, não admito preconceito com ninguém”. Durante uma aula, ela fez uma intervenção sobre a importância de colocarmos as pautas trans dentro do movimento de mulheres, que, segundo ela, ainda reproduz transfobia.
Sarah também avalia que a situação das LGBTs , sobretudo trans e travestis, piorou com a pandemia de Covid-19, que aprofundou a opressão e a exploração. “Minha amiga que é cabeleireira, por exemplo, suspendeu as atividades do salão durante a pandemia, e não recebeu o auxílio emergencial. Ela enfrentou uma situação muito complicada”, contou.
No sábado (17), sua amiga Rebeca foi vítima de 30 facadas. Sarah mobilizou um ato em solidariedade à amiga e contra a transfobia.
Sarah acha que a criminalização da LGBTfobia pelo Supremo Tribunal Federal foi importante, mas é insuficiente. “As pessoas trans não podem sequer ir numa praça conversar com amigos com tranquilidade. É por isso que eu sigo sempre lutando”.
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